Saúde
Depressão: Conheça três histórias de luta e superação
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Após passarem por períodos difíceis, jovens mostram que é possível tratar a doença e incentivam a procura por ajuda.
“Depressão é uma doença como qualquer outra e pode atingir qualquer pessoa, em qualquer época da vida”. É assim que o psiquiatra Dr. Antônio Geraldo da Silva, presidente da Associação Psiquiátrica da América Latina (APAL) começa a explicar a doença.
A depressão é um transtorno mental que está no dia a dia de muitas pessoas. Segundo o último relatório divulgado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), são mais de 300 milhões de pessoas que vivem com a doença no mundo.
Lidar com o transtorno é um processo longo e difícil. Por isso, hoje, vamos conhecer histórias de pessoas que superaram e estão superando a depressão. São relatos de quem passou por momentos conturbados e tiveram, praticamente, que parar a própria vida para enfrentar a doença. Graças ao tratamento correto, essas pessoas conseguiram voltar à rotina.
1 – “A minha força veio do meu filho”
Uma pessoa divertida e animada. É assim que diz que era, antes de descobrir que estava com depressão. Tudo começou aos 26 anos, por causa do término do relacionamento com a mãe do seu filho. De uma pessoa entusiasmada, Filipe se transformou numa pessoa que começou a não querer sair, a não fazer nada, a chorar com frequência e, confessa, teve até pensamentos suicidas.
A partir daí ele resolveu procurar ajuda. Foram quase três meses com os sintomas, até a decisão de procurar tratamento. “Eu mesmo era daqueles que tinha preconceito de procurar psiquiatra, psicólogo, de achar que estava bem, que não sou doido, que isso [tratamento] para mim é coisa de doido. Então, levei de uns dois a três meses para entender que não era normal, que não era do meu cotidiano, da minha pessoa, a partir daí decidi procurar ajuda”, relembra o jovem.
Primeiro ele procurou um psiquiatra que, logo depois, o encaminhou para uma psicóloga. Durante o período de tratamento, chegou a tomar três tipos de medicamentos: um para um para ansiedade, um para depressão e um estabilizador de humor. Mas, para Filipe, a terapia foi o fator principal no processo de cura. Fez tratamento com psicólogo durante um ano e tomou medicamentos por seis meses.
Questionado sobre de onde veio a força para seguir em frente e não desistir, ele foi direto: “Veio do meu filho mesmo! Ele é pequeno, tem 3 anos. Então ele era o que mais ajudava a procurar ajuda, fazer terapia e a tentar melhorar”, afirma.
Hoje, livre da depressão, Filipe voltou à rotina e se esforça para estar sempre entre familiares e amigos. Ao fazer uma análise do próprio caso, ele entende que dias e momentos ruins sempre vão existir. “Não tem como ter uma vida perfeita e está tudo bem. Problemas vão ter e tem que aprender a lidar com eles e saber que uma hora passa e que vai conseguir dar a volta por cima”, alerta.
Além disso, faz questão de reforçar a importância de buscar apoio e deixar um recado para aqueles que estão passando por um momento difícil. “Procure ajuda! Porque passa muita coisa na cabeça da gente e, se não procurar ajuda, infelizmente, pode acontecer até a questão do suicídio. Tentar se abrir com os outros, procurar ajuda o mais rápido possível assim que perceber algo diferente, que não é habitual, mesmo que não seja nada para não ficar pior ou agravar a situação que estava”, conclui.
2 – “A depressão foi um momento muito difícil, mas fez eu me conhecer”
A jovem Marina Lisbão de Carvalho, de 22 anos, também enfrentou a doença, não uma; mas duas vezes. A primeira, aconteceu na pré-adolescência, quando ela tinha por volta de 13 anos. Na época, segundo a jovem, não foi tão intensa. A segunda crise veio entre 2016 e 2017.
A estudante conta que, no período mais difícil da depressão, sentia desanimo constante, apatia, não tinha perspectiva de futuro, vivia isolada e até chegou a se mutilar e a ter pensamentos suicidas. A busca por um tratamento partiu da família, principalmente da mãe, que estava muito preocupada. “Eu tinha até uma certa resistência, porque eu estava muito mal, nunca tinha feito acompanhamento psicológico e, para mim, aceitar fazer o tratamento era dizer que eu estava muito mal e eu vivi em negação com isso, que era depressão”, relembra a jovem que começou o acompanhamento no início de 2017.
Marina tomou remédios por um ano. Atualmente está livre do medicamento e faz apenas tratamento com psicólogo. “Foi um período muito, muito importante. Eu vejo toda a importância desse acompanhamento para o meu processo de melhora, porque é essencial mesmo, ter um profissional te acompanhando”, acentua.
Ao fazer um balanço das causas que a levaram à depressão, Marina pontua que a pressão diária da faculdade e problemas no ambiente de trabalho faziam com que vivesse em constante ansiedade, fatores que serviram como gatilho para a crise. Mesmo com as dificuldades causadas pela doença, a estudante conta que a experiência trouxe lições que a fizeram rever a própria vida, mudar hábitos e a entender os pontos que precisavam ser mudados.
“O processo depressivo pra mim foi muito difícil, mas ao mesmo tempo me fez enxergar muita coisa. Me fez me conhecer. Antes da depressão eu me negava a entrar em contato com aspectos emocionais mais difíceis. Fugia sobre falar disso e dos meus sentimentos, sobre o meu estado. A depressão me fez, talvez, aprender a trabalhar um pouco mais com isso”, conta a jovem, que chegou a trancar a faculdade de comunicação e abandonar o estágio para se cuidar.
Passada a pior fase, a estudante pede que as pessoas não se sintam responsabilizadas por estarem passando por esse tipo de situação, pois a depressão é tão comum como qualquer outra doença. “Primeiramente, temos que tirar o fator de culpa das coisas. Eu sentia que quando estava em crise muito forte eu me culpava muito por estar passando por aquilo e estar fazendo as pessoas que estão perto de mim passarem por aquilo também. Acho que isso tem que ser retirado”, desabafa.
O apoio da família, dos amigos e da religião foram fundamentais na recuperação. Para ela, é preciso ter empatia e cuidado com quem tem depressão. Além disso, incentiva quem está enfrentado a doença a não ficar isolado. “É momento de buscar uma rede de apoio, pessoas que você confia, pessoas que não te culpabilizam por estar passando por isso. E procure, aos poucos, coisas que vão te reanimando. Por exemplo, se precisar abandonar algumas coisas, abandone, dê um tempo”, aconselha.
3 – “Hoje me vejo mais disposta para tudo”
Para Anna Luisa de Carvalho, de 21 anos, os sintomas da depressão surgiram no começo de 2018, durante um intercâmbio na França. Ela percebeu que algo estava errado quando começou a não querer mais sair com os colegas, conhecer nenhum lugar e só queria ficar em casa. “Fui começar a perceber que tinha algo de errado quando comecei a me isolar dos meus amigos de antes, de não responder mensagem, de não querer ligar, não querer falar com os meus pais. Ali eu percebi que tinha alguma coisa errada”, explica a estudante de Relações Internacionais.
Logo em seguida, a jovem começou a apresentar os sintomas da ansiedade, como taquicardia e pensamentos confusos. Logo que voltou para o Brasil, Anna Luisa decidiu, por conta própria, procurar ajuda. Atualmente, continua com os acompanhamentos psicológico e psiquiátrico. “Hoje, eu me vejo, com certeza, mais disposta para tudo, porque chega um ponto que você fica muito cansado, mas com o tratamento acaba passando e consegue fazer mais as suas coisas. Consigo me ver gostando de novo das coisas. Eu consigo ter mais perspectiva de futuro”, comemora.
A vontade de vencer a depressão e a certeza de que, em algum momento, se recuperaria foram fundamentais no processo. “Eu via nessas pessoas [que tiveram depressão] um pouco de motivação e se elas conseguiram eu iria conseguir também, em algum momento. Pode demorar um tempo, três meses, cinco anos, mas ainda assim, uma hora vou sair disso”, afirma.
Além de incentivar a busca pelo tratamento, Anna pede que as pessoas tenham paciência e empatia com quem sofre com o transtorno. “Estejam preparados para lidar com essas pessoas, porque é complexo, é uma situação muito delicada”, conclui.
A depressão
De acordo com o último relatório da Organização Mundial da Saúde, divulgado em 2017, 11.548.577 pessoas sofrem de depressão no Brasil. O número corresponde a 5,8% do total da população. Para o Dr. Antônio Geraldo da Silva, ninguém está livre de ter a doença, que possui alguns fatores desencadeadores para o seu aparecimento, desde o tipo de vida que o indivíduo leva, até os estresses diários. Entre os diversos fatores, o especialista chama a atenção para alguns sintomas.
“São de 2 a 4 semanas apresentando uma tristeza intensa, falta de alegria, de prazer, falta de vontade, de interesse. Aumento de apetite ou diminuição do apetite, aumento ou diminuição do sono. Falta de fazer as coisas, tanto de trabalho ou lazer. Cai várias questões do corpo, como diminuição da memória, da libido, da capacidade de trabalho e de produção, são as características maiores do quadro de depressão”, explica.
Alguns hábitos são muito importantes para quem vive com a depressão e também quer evitar a doença. De acordo com o psiquiatra, atividades físicas regulares, horários de dormir e acordar e alimentação adequada são importantes no tratamento. “Quando você também tem alimentação adequada com frutas e verduras, você tem os precursores para fazer as catecolaminas internas. Então, boa alimentação é importante. E boa convivência. E evitar os fatores desencadeadores estimulantes, como cafeína, nicotina, álcool e outras drogas”, recomenda.
Como lidar com as pessoas que convivem com a depressão?
Marcos Vinícius, psicólogo clínico graduando pela Universidade Católica de Brasília (UCB), explica que, quando se trata da depressão, a primeira coisa é entender que não se trata de frescura e que as pessoas não querem chamar atenção. É uma doença que tem tratamento, por isso é importante dar apoio e incentivar a procura por profissionais especializados.
Além disso, alerta para os cuidados que se deve ter com os indivíduos que sofrem com a depressão, pois muitas vezes, na tentativa de ajudar pode-se piorar o quadro clínico. “Eu sempre digo que a primeira coisa a se fazer é acolher essa pessoa e escutar sem julgamentos, nunca fazer censuras, mas pelo contrário, mostrar a essa pessoa que você a valoriza. É fundamental entender e aceitar que existe, sim, um problema e que precisa dar devida atenção a isso”, ressalta o profissional.
Se você sofre ou conhece alguém que está passando por esse tipo de transtorno, busque ajuda o mais rapidamente possível. Para isso, também existe o Centro de Valorização da Vida (CVV), que trabalha com apoio emocional e prevenção ao suicídio. Basta ligar para o 188 de qualquer lugar do Brasil, que voluntários estarão disponíveis 24 horas por dia para o atendimento. O serviço é gratuito e a pessoa não precisa se identificar.
Tainá Ferreira
Jornalista formada pela Universidade de Brasília (UnB), Tainá começou na Empresa Júnior Movimento e depois atuou na TV universitária UnBTV. Depois de um tempo entrou para a redação do jornal Correio Braziliense e, após a experiência, partiu para a assessoria de imprensa.